A incapacidade cognitiva de uma nação
Como a cultura da ignorância modifica todo o comportamento de uma população que é explorada por quem utiliza essa fraqueza em seu projeto.
É muito interessante compartilhar dados sobre a leitura no Brasil em uma rede pública aberta a comentários. As críticas aos números — que são feitas como se aquilo fosse mera opinião do mensageiro — simplesmente confirmam o que foi exposto: as pessoas não leem e, as que leem, não conseguem interpretar um simples texto.
Certamente que não são todos, mas, veja, tenho que dizer isso, pois essas pessoas leriam o primeiro parágrafo acima (as que conseguem ler) e de imediato já apontariam o dedo: “mas não são todas”.
Claro que não são todas. Mas, justamente por vivermos numa sociedade em que as pessoas não leem, estamos diante de um público incapaz de compreender o subentendido e a inferência, muito menos figuras de linguagem.
Num texto, há informações que não são ditas, pois elas, em tese, são automaticamente deduzidas a partir do enunciado do contexto. Você, interlocutor que me lê, com seu conhecimento de mundo, entende o exagero retórico de uma expressão como “as pessoas não leem”, pois sabe que é óbvio que muitas pessoas leem e gostam.
Mas isso depende da inferência, que é o processo cognitivo que usamos para chegar ao subentendido. E quem não lê (e também os idiotas) tem grandes chances de não ter desenvolvido esse processo.
E assim, retorno ao argumento que sempre uso: vivemos em uma sociedade de manchetes. É o máximo que as pessoas leem, quando leem. Por isso, numa época em que a mídia é o quarto poder, cometer certos “deslizes” nas manchetes nem sempre é acidental.
“Idosa armada invade banco e mata segurança”
É uma manchete que diz tudo, não é? Claro que não. O artigo, quando lido, explicará que a idosa, ao passar pela porta do banco, foi rendida pelos bandidos que estavam assaltando a agência, e um deles era o próprio segurança do banco. Ela, milagrosamente, conseguiu tomar a arma de um deles, enquanto o segurança, em surto, entrava na agência com a intenção de matar todos. Ela “invade” o banco tomado e atira no segurança.
A manchete mentiu? Não. Mas levou você a crer em algo muito diferente. E antes de ler o texto, você já espalhou a notícia da velha assassina pelos grupos de WhatsApp.
O mesmo é feito com a política e a economia.
Por isso, nenhum argumento contrário à crítica à população que não lê é válido. Independentemente dos motivos e da história que levaram o povo à ignorância, o problema ainda existe: as pessoas não leem.
“Ah, as pessoas são pobres e não conseguem comprar livros”; “a pessoa chega cansada do trabalho, não consegue ler, pois tem que descansar”; “os governos nunca incentivaram o povo à leitura”; etc., etc. Esses são argumentos reais usados nos comentários e, mesmo que facilmente rebatidos, mesmo que representassem a verdade, ainda não contradizem o problema final:
O povo não lê e, por não ler, não consegue compreender o mundo em que vive e as informações que recebe. E essas pessoas são obrigadas a votar.
“Independentemente dos motivos e da história que levaram o povo à ignorância”. Esse é um aspecto que não pode ser minimizado.
A compreensão dos processos históricos é fundamental para a análise de dados sociais e para a formulação de propostas de mudança realmente eficazes.
A realidade incontestável de que, no Brasil, a maioria da população não lê não pode ser interpretada como fruto do acaso, tampouco atribuída exclusivamente aos indivíduos, como se fossem, por natureza, inferiores a sujeitos de outras nações com maior índice de leitura. Muitos estudiosos do tema, como Bourdieu por exemplo , apontam que o acesso à leitura e ao capital cultural é socialmente condicionado e reproduz desigualdades estruturais.
Tenho me dedicado à leitura e ao estudo da história, e cada vez torna-se mais claro por que o presente brasileiro se configura da maneira como se apresenta e o quanto é urgente que o país passe por transformações estruturais. Essas mudanças devem abranger não apenas a educação formal, mas também todos os demais fatores que a influenciam e com ela se articulam.
O acesso a direitos básicos como moradia, alimentação, transporte, saúde, esporte e cultura é profundamente transformador, tanto para o indivíduo quanto para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e crítica.
E se for uma questão de genética msm? Gente burra gerando gente burra. Bom... estou dizendo isso aqui pois em voz alta em qualquer outro lugar o argumento já seria jofado em algum extremo.