Silêncio
Estamos silenciando alguns. Amanhã estaremos todos calados.
São tempos difíceis. Não podemos mais falar. Se não repetirmos incansavelmente os mantras da filosofia dos tempos difíceis, somos silenciados, calados, escurralhados.
Repitam, oh humanos esclarecidos: "tempos difíceis", "profissionais da saúde", "pessoal da linha de frente", "viva o SUS", "ciência". Esse último, inclusive, usado até a exaustão - por vezes de forma irresponsável e até manipuladora - como se ciência e cientista fossem a mesma coisa. Não: a ciência é infalível, o cientista é o oposto.
A ciência é o método. É a ferramenta criada pelos cientistas para os salvaguardarem de sua própria falibilidade, sua propensão ao erro e até mesmo sua ideologia e emoção. E salvo quando for para comemorar uma grande descoberta, a emoção é prejudicial ao cientista. E por isso a ciência está ali: para resguardá-lo de sua humanidade.
Mas são tempos difíceis. Nervos a flor da pele e uma guerra sócio-política usando os tempos difíceis como arma e a ignorância como campo de batalha. Tudo foi politizado e, nessa guerra, a lei marcial impede que palavras sejam ditas.
É compreensível - muito até - a incansável perseguição e silenciamento daqueles que não cantam os mantras dos tempos difíceis. Ao pensar que eles podem estar influenciando outras pessoas ao erro e, assim, colocando em risco todo o planeta, nada mais natural do que usar uma pitada de repressão para calá-los. Redes sociais proíbem o uso de expressões, governos mandam prender, a massa, intelectualizada pelos jornais e políticos escurralham os transgressores, os negacionistas e genocidas. E a "ciência" é o confiável embasamento para essas ações.
Seja quem é que está certo, seja o argumento a ciência ou o cientista, seja o que for: calar as pessoas é algo muito sensível. Por mais correto que pareça, por mais justo que pareça, por mais cientificamente comprovado que pareça: calar as pessoas que questionam algo, pode trazer resultados e abrir precedentes para tempos mais difíceis ainda no futuro.
Sabemos que a palavra tem poder. Foi através de palavras acaloradas que Hitler subiu ao poder e levou o mundo para a guerra. E se ele tivesse sido calado? Na verdade a maioria dos ditadores chegam ao poder através da palavra. Esse seria o argumento perfeito para usarmos o "cala-boca" como ferramenta do bem. Mas não podemos esquecer que esses ditadores só continuaram no poder porque calaram a boca daqueles que falavam contra. E foram apoiados nessa repressão, foram inclusive auxiliados nela.
Ao instituir qualquer tipo de ferramenta para reprimir o mal, ela também será usada para reprimir o bem. É simples assim.
O questionamento, por mais idiota que pareça a você, não pode ser silenciado. A própria ciência vive do questionamento.
Se você for calar e proibir tudo que tem grande potencial de fazer o mal, matar muitas pessoas, espalhar fake news , levar grandes massas a acreditarem em algo sem nenhum embasamento científico e que movimentaria governos, decisões políticas, guerras e grandes divisões sociais, acho que você irá travar uma cruzada contra alguns bilhões de pessoas que seguem e pregam essa semente. Na verdade, você seria parte de uma minúscula minoria em meio a essa massa humana que se encontra para adorar um dragão na garagem.
Mas no argumento dos tempos difíceis, você talvez, faça parte da massiva maioria. A minoria prega o contrário, questiona, alguns até de forma idiota e com argumentos absurdos. Outros com argumentos interessantes, mas que podem acabar, de acordo com o que lhe foi pregado, prejudicando todos os demais.
A questão que coloco na mesa, então, é: vamos supor que você, em suas certezas, em sua realidade e em tudo que lhe foi pregado e ensinado, você soubesse que há uma pequenina chance de que você esteja errado. Bem pequena, mesmo. Mas existe. Você apoiaria a repressão e a censura contra quem questiona ou expressa o contrário?
Cuidado com sua resposta. Ela já criou muitos eventos catastróficos na história.


